27 de set. de 2009

De estilhaço e de aço


Ele cuspiu no braço dela e sorriu com o piercing no lábio que só faz sorrir.Talvez por conta daquele cabelo enorme com pontas para todos os lados. Loiro e laranja, seco e desajeitado.
Talvez ele cuspiu, pois ela era gorda e usava uma calça de zebra colada, que lhe marcava cada vinco, cada rachadura, cada cicatriz.
Ele cuspiu no braço dela e sorriu enquanto o metrô enchia de gente e olhava aquela peruca bicolor.
O sorriso dela se apagou sob os olhos pintados de preto. Ele sentou ainda sorrindo.
Lentamente, eu vi a mão dela limpar o cuspe. Disfarçadamente. Como se arrancasse a pele.
Eu vi tudo isso.
Vi o olhar dela feito pedra acompanhar os vultos do metrô. Ele cuspiu na força com que ela segurava a barra.
Ela endireitou o corpo e ficou mais ereta do que nunca.
Eu fiquei com vergonha e olhei para dentro de mim querendo perder os poderes, perder as energias e a força.
Também quis chorar com ela.
Mas, eu também não consegui.
Sem perceber, estava ereta em meu assento.
Só esperando o primeiro julgamento.
Quem me sentenciou, fui eu.

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